Ética e Privacidade: UX Research em Cidades Inteligentes

Raquel Cordeiro
Designer e UX Researcher
,
UPDATE:

A pandemia mudou tudo em 2020.
Por isso este artigo foi revisitado por quem escreveu em entrevista para o UXNOW com apoio da Deeploy.me

Imperdível!

Ouça este artigo

Artigo narrado por quem escreveu!

Trabalhar como pesquisadora em experiência do usuário é algo muito gratificante, já que estudar o comportamento humano para melhorar a experiência de um produto ou serviço pode ter um grande impacto na vida das pessoas. Porém, nem sempre as descobertas de uma pesquisa são utilizadas para o benefício dos usuários; às vezes, o foco principal está no negócio ou no lucro da empresa. Em uma sociedade cada vez mais conectada, expandimos a atuação do pesquisador para estudar a experiência da população nas cidades inteligentes. A nova pergunta que surge é: qual o papel do UX researcher em relação à ética e à privacidade desses cidadãos?

Nos últimos anos, temos discutido a ética da atuação dos designers nas chamadas dark patterns, ou padrões obscuros. Esse termo foi criado para designar estratégias e funcionalidades inseridas para "enganar" ou induzir o usuário a realizar ações indesejadas ou sem perceber, como ficar mais tempo conectado ou comprar algo por impulso. Frequentemente, alguns recursos são criados com boa intenção, mas podem ser transformados e usados de maneira involuntária pelo usuário. 

Um exemplo recente foi o escândalo da Cambridge Analytica [Documentário The Great Hack], em que uma empresa privada utilizava dados do Facebook para comunicação estratégica eleitoral. Muitas pessoas compartilhavam inocentemente seus dados na internet, sem noção das consequências mundiais da manipulação de informação e opinião pública que isso poderia gerar.

Imagem de divulgação do filme The Great Hack

Quando pesquisamos, temos acesso a muitos dados. Alguns são disponibilizados conscientemente pelos usuários, como quando perguntados em entrevistas ou questionários; e outros são coletados de forma passiva, como pelo Google Analytics, Facebook ou testes A/B. Essas informações podem ser utilizadas para melhorar o produto, mas, dependendo da política de privacidade, pode haver uma limitação de uso. 

Um exemplo é a inteligência artificial dos assistentes virtuais. O Google Assistente utiliza um grande volume de dados capturados pelos produtos do Google, fazendo com que o programa tenha um volume maior de informações para “aprender" o comportamento e aprimorar o reconhecimento do comando de voz, obtendo respostas mais assertivas. Já a Siri, assistente da Apple, tem acesso a menos dados, e consequentemente, um menor aprendizado de máquina e precisão do serviço.

Em se tratando de cidades inteligentes, muitos serviços são conectados e os dados da população ficam disponíveis para vários órgãos governamentais, às vezes sem nosso conhecimento. Neste ano de 2019, Hong Kong foi centro de vários protestos, inclusive contra a vigilância tecnológica de Pequim, famosa por ser um dos lugares mais conectados do mundo. Como confiar que esses dados capturados pelo governo estão sendo utilizados para melhorias de serviços públicos, e não para o controle populacional?

Manifestantes em Hong Kong protegidos por guarda-chuvas: contra o clima, gás de pimenta e pela sua privacidade.

Na indústria de saúde, informações sobre a população podem melhorar o serviço médico, transformando a saúde pública. Com sintomas e diagnósticos em massa, por exemplo, governos podem trabalhar no foco de uma epidemia, impedindo seu avanço para outras áreas. Sistemas de inteligência artificial podem aprender padrões e até prevenir doenças mais graves. Porém, quem pode ter acesso a um banco de dados sensíveis sobre as pessoas, e o quanto pode ser usado? Como regulamentar de uma forma organizada e segura? 

A Microsoft definiu alguns princípios éticos para guiar o desenvolvimento e uso de inteligência artificial. São eles: justiça, inclusão, confiança, transparência, privacidade, segurança e responsabilidade. Eles criaram um jogo chamado Judgement Call, que ajuda a tomar decisões baseadas nesses princípios com foco nos stakeholders.

Muitos países já estão debatendo sobre a privacidade dos dados. No Brasil, em 2020, entrará em vigor a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), projeto discutido durante anos por diversos setores da sociedade. Entretanto, outras decisões estão sendo tomadas pelo governo sem transparência, como o projeto de união de banco de dados, com informações sensíveis disponibilizadas entre órgãos públicos

No contexto de cidades conectadas, há várias fontes de captação de dados, como sensores, apps, fontes administrativas, crowdsourcing, sistema de informação geográfica, imagens, vídeos e redes sociais. Dessa forma, vale enfatizar algumas dicas de como podemos proteger os dados em pesquisa: dar autonomia de escolha ao indivíduo, anonimato nas informações, deixar clara a finalidade do uso dos dados, restringir o tipo de acesso e por quem, cuidar do armazenamento e do descarte.

Captura de Tela 2019-07-27 às 19.27.33.png
Big data e gerenciamento urbano: fontes de dados

O papel do pesquisador também engloba a privacidade dos dados que está coletando, bem como sua aplicação de forma ética. A sociedade sempre utilizou informações para tomar decisões, mas atualmente está acontecendo uma grande mudança. Por causa da diminuição da complexidade e do maior acesso a novas tecnologias, um número significativo de dados de alta qualidade está disponível para a população. Em contrapartida, técnicas de reconhecimento e interpretação de imagem e áudio podem automatizar pesquisas com o usuário. Também é responsabilidade dos pesquisadores utilizar esses dados sem violar a privacidade dos cidadãos.

O futuro parece preocupante, mas a discussão deve passar por uma descentralização e abertura dos dados, com transparência e poder para a população. Já sabemos da importância e do valor dos dados, por isso é necessário que eles não estejam sob controle de poucas pessoas, e sim distribuídos pela sociedade. Não tem mais sentido trabalharmos com Smart Cities (cidades inteligentes) e não falar em Smart Citizens (cidadãos responsáveis).

Imagino que a tendência é ter cada vez mais pesquisas em laboratórios de co-criação, em que a participação popular necessita estar presente e a inovação em serviços públicos seja feita com o cidadão no centro das tomadas de decisão. As cidades inteligentes são estruturadas pensando no que os cidadãos querem, e investindo em maneiras mais eficazes de alcançar esses resultados. Elas colocam as pessoas - e não a tecnologia - no centro das estratégias e investimentos. Dessa forma, podem ser adotadas algumas técnicas de outras indústrias, tais como: pesquisa de mercado em profundidade, laboratórios de experiência do cidadão e programas piloto para encontrar problemas e ajustar o desempenho, antes de lançar produtos ou serviços em escala.

A minha aposta é que o futuro da pesquisa com usuários englobará cidades inteligentes centradas no cidadão. Podemos ajudar na regulamentação dessas informações, manter o anonimato e privacidade ao utilizar os dados para aprimorar os serviços e definir boas práticas baseadas nos princípios éticos para os dados serem utilizados de forma a ajudar a população. Assim, o papel do pesquisador também consiste na urgente conscientização de utilizá-los de maneira responsável.

Não perca novos artigos no site e no podcast!
Não quero mais ver isso
Patrocinado:
Dados computados com sucesso!

(Essa mensagem não foi escrita por um UX Writer)
Vixi Maria! Algo errado não está certo...

Pode tentar de novo?

Se não conseguir, pode memandar um email que eu coloco seu nome da neswletter nem que seja na base do papel e caneta!

Vitor Guerra
vitor@pulegada.com.br
Raquel Cordeiro
Designer e UX Researcher
,

Mestra pela ESDI, UERJ, pós graduada em Gestión de Proyectos Gráficos pela Elisava, de Barcelona, certificada em UX pelo Nielsen & Norman Group e graduada em Desenho Industrial, pela UFRJ. Possui mais de 15 anos de experiência trabalhando em grandes empresas, startups, consultoria e como autônoma.

A história por trás do Design 2020, via Design Team

Como foi seu dia de trabalho?

Paola Sales
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Paola Sales

O papel do designer está um pouco amassado. Como ele estará no futuro?

Caio Calderari
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Caio Calderari

Machine Learning e UX: insights e aprendizados (até agora…)

Carla De Bona
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Carla De Bona

A importância de UI Design em um produto digital e a sua relação com UX

David Arty
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
David Arty

A natureza contraditória de um Product Owner

Hélio Basso
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Hélio Basso

Uma visão holística de Acessibilidade, UX e Dados como soluções que atendam a todos

Liliane Claudia
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Liliane Claudia

Seu produto é honesto com o usuário?

Flávio Pires
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Flávio Pires

Aprenda a atender expectativas e nunca mais (ou quase) lide novamente com frustrações!

Marcelo Sales
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Marcelo Sales

UX das Coisas: IoT, design e tecnologia na era dos dados

Thiago Barcelos
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Thiago Barcelos

Caminhos; experiências e narrativas

Clécio Bachini
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Clécio Bachini

Por que você precisa fazer a lição de casa

Mao Barros
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Mao Barros

Desenhar telas não vai salvar o mundo

Bruna Amancio
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Bruna Amancio

Empreendedorismo feminino em UX Design

Patricia Prado
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Patricia Prado

Chegou a hora da nossa gente bronzeada mostrar seu valor

Guilhermo Reis
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Guilhermo Reis

O ensino do Design nos tempos de quarentena

Edu Agni
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Edu Agni

Mais atividades, mais designers (e mais dificuldades)

Guilherme Gonzalez
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Guilherme Gonzalez

O poder da visão holística e do posicionamento estratégico do UX

Priscilla Albuquerque
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Priscilla Albuquerque

Desenhando para gigantes

Fares Hid Saba Junior
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Fares Hid Saba Junior

Eurocentrismo, Identidade e Negritude

Wagner Silva
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Wagner Silva

O Design System nasceu! E agora? Como manter ele funcionando?

Thaise Cardoso
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Thaise Cardoso

O choque das gerações para a liderança de design

Rodrigo Lemes
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Rodrigo Lemes

Os desafios da pesquisa compartilhada

Desirée Sant'Anna Maestri
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Desirée Sant'Anna Maestri

Reflexões sobre desenho de experiências com Inteligência Artificial e voz

Melina Alves
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Melina Alves

UX Como SAC

Richard Jesus
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Richard Jesus

Design de produtos digitais em agências

Marcela Hippe
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Marcela Hippe

O que você precisa saber sobre métricas para ser um UXer com uma visão 20/20

Allan Cardozo
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Allan Cardozo

Dia da Marmota

Daniel Furtado
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Daniel Furtado

O iminente estouro da bolha de UX

Thomaz Rezende Gonçalves
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Thomaz Rezende Gonçalves

Vieses racistas: como combatê-los no design

Karen Santos
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Karen Santos

Design estratégico - como a percepção sistêmica torna meu trabalho mais eficiente

Vilma Vilarinho
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Vilma Vilarinho

A visão cliente é o ponto de intersecção dos meus “dois mundos”

Denise Rocha
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Denise Rocha

O que é o design centrado no usuário se não são as pessoas?

Priscila Siqueira de Alcântara
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Priscila Siqueira de Alcântara

O bom design começa dentro de casa

Rodrigo Peixoto
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Rodrigo Peixoto

A (in)visibilidade da acessibilidade e inclusão nos eventos de Design

Ana Cuentro
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Ana Cuentro

Vamos criar novos líderes?

Claudia Mardegan
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Claudia Mardegan

How might we…. Como [nós, designers] podemos construir um 2020 para nos orgulhar?

Letícia Pires
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Letícia Pires

O Design está morto. Longa vida ao Design!

Al Lucca
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Al Lucca

Indo além das boas práticas de User Experience Design

Rafael Miashiro
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Rafael Miashiro

Os assistentes de voz e os desafios de desenhar interfaces conversacionais em 2020

Karina Moura
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Karina Moura

O criatividade das cavernas

Thalita Lefer
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Thalita Lefer

Acessibilidade como ponte de empatia para o diverso

Livia Cristina Gabos Martins
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Livia Cristina Gabos Martins

Design como um todo

Roberta Nascimento de Carvalho
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Roberta Nascimento de Carvalho

Projetar para durar. Uma análise crítica da nossa profissão e dos produtos que projetamos

Filipe Landu Nzongo
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Filipe Landu Nzongo

Acessibilidade com foco no usuário

Elias Fernandes
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Elias Fernandes

Escolhi ser designer no Brasil, e agora?

Bernardo Carvalho Wertheim
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Bernardo Carvalho Wertheim

Você não sabe nada

Bruno Rodrigues
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Bruno Rodrigues

Os próximos desafios do design

Anderson Gomes da Silva
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Anderson Gomes da Silva

Designers em (form)ação

Thiago Esser
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Thiago Esser

Design como ferramenta de exclusão social

Diego Rezende
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Diego Rezende

É hora de falar de ética na construção produtos digitais

Ana Coli
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Ana Coli

Formação e organização de times de Design

Victor Zanini
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Victor Zanini

Como fugir da mediocridade

JP Teixeira
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
JP Teixeira

Desenhando o futuro

Natalí Garcia
Revisado após a pandemia
disponível em áudio
Natalí Garcia
Design 2020 também está disponível como podcast.

Updates
periódicos!
Ouça no Spotify